“As pessoas morrem.
UTI não salva vidas”. A frase é de uma representante da assessoria de
comunicação da Secretaria da Saúde do DF. A resposta veio após pedido de
esclarecimento do órgão em relação à morte do recém-nascido Davi Luís, que
tinha apenas 15 dias de vida. Ele morreu no Hospital Regional do Paranoá,
aguardando um leito de UTI, mesmo com decisão judicial que determinava a internação
imediata. O bebê nasceu com apenas 1,8 kg, problemas no coração e hérnia no
umbigo.
O JBr acompanha o
drama da família há mais de uma semana. Ontem, o pai dele, o porteiro Osmar
Ribeiro Cardoso, procurou a reportagem para dar a triste notícia. Sem condições
de falar muito, ele apenas resumiu o sentimento da irreparável perda: “Era meu
sexto filho, uma das minhas vidas. Mataram meu filho”, disse por telefone. No
cartório do Paranoá, as atendentes confirmaram: o pai registrou o óbito do
filho.
Tristeza
Depois de falar
alguns poucos minutos com a reportagem, o pai desligou o celular. Não foi mais
encontrado. Antes, porém, ele disse: “Estou tão perdido, não sei se consigo
conversar. A dor é demais”, lamentou, aparentando que ainda tentava assimilar a
morte do filho.
É comum encontrar
familiares desesperados nas filas das defensorias públicas da região em busca
de um leito em UTI. Só no primeiro trimestre deste ano, o Ministério Público do
DF registrou 374 ações movidas por cidadãos relacionadas à precariedade da
saúde pública. No ano passado, 169 pessoas morreram à espera de leitos de UTI.
Bravamente, o
porteiro Osmar Ribeiro Cardoso lutou para tentar garantir um leito para seu
filho. Mas toda a história poderia ter sido diferente, caso a decisão judicial
tivesse sido cumprida. Sobre isso, a assessora da Secretaria de Saúde também
falou: “Não faltou atendimento adequado. A criança teve toda a assistência,
mas, infelizmente, as pessoas morrem. Nós tínhamos uma lista de prioridades e o
bebê precisava aguardar”, salientou.
Sem direito a uma
segunda chance
Para o especialista
em administração pública da UnB José Matias Pereira, as respostas da Secretaria
de Saúde, além de inoportunas, são agressivas e não condizem ao fato de que se
perdeu uma vida. “Essas frases mostram como o GDF está na defensiva. Isso
comprova como a saúde pública da região está abandonada”, apontou.
O professor
ressaltou que Estado privou os pais da criança de saber se ele sobreviveria
após tratamento adequado em um leito de UTI. “Foi tirado deste bebê o direito a
uma segunda chance. Um direito garantido constitucionalmente, que não foi
respeitado pelo GDF”, avaliou. A função do governo, denunciou, é dar a
oportunidade às pessoas de ter atendimento digno para, pelo menos, lutar contra
a morte.
DESABAFO
Na época em que foi
encontrado na Defensoria de Saúde tentando uma vaga em UTI para o filho, Osmar
Ribeiro desabafou à reportagem: “Acho que falta interesse do governo. Venho
aqui na Defensoria, mas meu filho pode morrer a qualquer momento. Se isso
acontecer, vou culpar o governo, que não dá uma saúde de qualidade”. O porteiro
não queria ver seu filho morrer “pagão” e conseguiu batizá-lo. Davi vai ser
velado e enterrado hoje, no cemitério Campo da Esperança, em Sobradinho, a
partir das 16h.
Entenda o caso
Com apenas 1,8 kg e
vários problemas de saúde, o sexto filho de Osmar ficou internado no Hospital
do Paranoá. O bebê nasceu em 27 de maio, com problemas cardíacos, hérnia no
umbigo e contraiu pneumonia e infecção urinária. A família procurou a Defensoria
Pública no dia 29 de maio e conseguiu no mesmo dia um mandado pela internação
de Davi em uma UTI.
Apesar de ter
ouvido dos médicos que o filho tinha 99% de chances de não escapar, o porteiro
continuou acreditando na recuperação. “Tenho esperança, como pai, e por ter
muita fé em Deus. Eu ainda acredito que não está tudo acabado, mesmo ouvindo
todo dia que meu filho teve algum tipo de piora”, disse na semana passada.
Por Carla
Rodrigues
Jornal de Brasília
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