quinta-feira, 13 de junho de 2013

DECISÃO JUDICIAL NÃO FOI O BASTANTE: BEBÊ MORREU À ESPERA DE VAGA EM UTI

“As pessoas morrem. UTI não salva vidas”. A frase é de uma representante da assessoria de comunicação da Secretaria da Saúde do DF. A resposta veio após pedido de esclarecimento do órgão em relação à morte do recém-nascido Davi Luís, que tinha apenas 15 dias de vida. Ele morreu no Hospital Regional do Paranoá, aguardando um leito de UTI, mesmo com decisão judicial que determinava a internação imediata. O bebê nasceu com apenas 1,8 kg, problemas no coração e hérnia no umbigo.
O JBr acompanha o drama da família há mais de uma semana. Ontem, o pai dele, o porteiro Osmar Ribeiro Cardoso, procurou a reportagem para dar a triste notícia. Sem condições de falar muito, ele apenas resumiu o sentimento da irreparável perda: “Era meu sexto filho, uma das minhas vidas. Mataram meu filho”, disse por telefone. No cartório do Paranoá, as atendentes confirmaram: o pai registrou o óbito do filho.
Tristeza
Depois de falar alguns poucos minutos com a reportagem, o pai desligou o celular. Não foi mais encontrado. Antes, porém, ele disse: “Estou tão perdido, não sei se consigo conversar. A dor é demais”, lamentou, aparentando que ainda tentava assimilar a morte do filho.
É comum encontrar familiares desesperados nas filas das defensorias públicas da região em busca de um leito em UTI. Só no primeiro trimestre deste ano, o Ministério Público do DF registrou 374 ações movidas por cidadãos relacionadas à precariedade da saúde pública. No ano passado, 169 pessoas morreram à espera de leitos de UTI.
Bravamente, o porteiro Osmar Ribeiro Cardoso lutou para tentar garantir um leito para seu filho. Mas toda a história poderia ter sido diferente, caso a decisão judicial tivesse sido cumprida. Sobre isso, a assessora da Secretaria de Saúde também falou: “Não faltou atendimento adequado. A criança teve toda a assistência, mas, infelizmente, as pessoas morrem. Nós tínhamos uma lista de prioridades e o bebê precisava aguardar”, salientou.
Sem direito a uma segunda chance
Para o especialista em administração pública da UnB José Matias Pereira, as respostas da Secretaria de Saúde, além de inoportunas, são agressivas e não condizem ao fato de que se perdeu uma vida. “Essas frases mostram como o GDF está na defensiva. Isso comprova como a saúde pública da região está abandonada”, apontou.
O professor ressaltou que Estado privou os pais da criança de saber se ele sobreviveria após tratamento adequado em um leito de UTI. “Foi tirado deste bebê o direito a uma segunda chance. Um direito garantido constitucionalmente, que não foi respeitado pelo GDF”, avaliou. A função do governo, denunciou, é dar a oportunidade às pessoas de ter atendimento digno para, pelo menos, lutar contra a morte.
DESABAFO
Na época em que foi encontrado na Defensoria de Saúde tentando uma vaga em UTI para o filho, Osmar Ribeiro desabafou à reportagem: “Acho que falta interesse do governo. Venho aqui na Defensoria, mas meu filho pode morrer a qualquer momento. Se isso acontecer, vou culpar o governo, que não dá uma saúde de qualidade”. O porteiro não queria ver seu filho morrer “pagão” e conseguiu batizá-lo. Davi vai ser velado e enterrado hoje, no cemitério Campo da Esperança, em Sobradinho, a partir das 16h.
Entenda o caso
Com apenas 1,8 kg e vários problemas de saúde, o sexto filho de Osmar ficou internado no Hospital do Paranoá. O bebê nasceu em 27 de maio, com problemas cardíacos, hérnia no umbigo e contraiu pneumonia e infecção urinária. A família procurou a Defensoria Pública no dia 29 de maio e conseguiu no mesmo dia um mandado pela internação de Davi em uma UTI.
Apesar de ter ouvido dos médicos que o filho tinha 99% de chances de não escapar, o porteiro continuou acreditando na recuperação. “Tenho esperança, como pai, e por ter muita fé em Deus. Eu ainda acredito que não está tudo acabado, mesmo ouvindo todo dia que meu filho teve algum tipo de piora”, disse na semana passada.

Por Carla Rodrigues

Jornal de Brasília

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