O
personagem principal era o mesmo, mas o cenário e o roteiro foram completamente
modificados. Em agosto do ano passado, Natan Donadon (sem partido-RO) foi
absolvido pelos colegas sob o véu do voto secreto em uma sessão quase esvaziada
— com 107 ausentes. Ontem, o plenário da Câmara dos Deputados estava cheio de
parlamentares com discursos inflamados. E, desta vez, não teve jeito. Em ano de
eleição e com o fim do sigilo, o agora ex-deputado federal, primeiro
parlamentar a ser preso no exercício do mandato, foi cassado por 467 votos.
Na
primeira sessão em que teve o mandato colocado em xeque, em agosto, 233
deputados foram favoráveis à cassação, 131 optaram pela absolvição e 41 se
abstiveram. Centro e sete ausências fizeram a diferença na manutenção do
presidiário no quadro do parlamento, pois faltaram 24 votos para a perda de
mandato mesmo após duas horas e meia de tempo aberto para a votação. Ontem,
foram necessários somente 35 minutos para o resultado: o voto do presidente
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) não foi computado, somente 44 parlamentares se
ausentaram e apenas Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), que tem condenação pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) ainda não transitada em julgado, se absteve de emitir
opinião. “Não me sinto à vontade na condição em que estou de julgar e condenar ninguém”,
justificou.
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Há
seis meses, Donadon circulava com desenvoltura no plenário, abraçando colegas
mais próximos, parando para fazer um lanche e sorrindo ao lado de parentes.
Subiu à tribuna, falou da falta de água para tomar banho e da má alimentação do
Complexo Penitenciário da Papuda, onde está detido desde junho, e fez um apelo
emocionado. Desta vez, o rondonense estava apreensivo. No início da semana,
avisou que iria novamente se defender na tribuna, mas, ontem, desistiu. No fim
da tarde, quando seu advogado, Michel Saliba, contava a decisão à imprensa,
Donadon surgia em outra porta.
O
ex-parlamentar entrou no Congresso por volta de 18h30, acompanhado de
seguranças, por um túnel subterrâneo do Anexo I da Câmara, passou pela área do
almoxarifado e subiu por um elevador de carga. Chegou de moletom, calça jeans e
tênis — tudo branco, como manda o figurino da Papuda. Ficou cerca de duas horas
na sala de reunião da Mesa Diretora, onde arrumou o cabelo e vestiu um terno completo.
Perguntado se havia conseguido tomar um banho, ele riu e confirmou.
O
advogado jurou ter sido surpreendido pela chegada do cliente. “Estou tão
surpreso quanto vocês, ele vai ser massacrado no plenário”, reclamou. Mais
tarde, Saliba explicou que os agentes da penitenciária teriam levado Donadon à
Câmara contra sua vontade. “Ele não queria vir, mas eles acharam lá que era
obrigatório e o trouxeram”, relatou o defensor. Já que estava lá, o rondonense
decidiu que queria defender-se na tribuna. Saliba e outros parlamentares,
porém, o convenceram do contrário. “Isso ia sangrar mais ainda a imagem dele.”
Donadon
ficou sentado no plenário, discreto, ao lado de outro advogado e cercado de
seguranças e jornalistas. Abraçou apenas poucos servidores e dois parlamentares
— Wladimir Costa (SDD-PA), que o procurou, e Cândido Vaccarezza (PT-SP), que
estava por perto. Apesar dos apelos da defesa, ele falou à imprensa. “O voto
aberto vai fazer com que meus colegas votem contra o coração e a vontade deles,
é uma prisão”, disse. “Meu processo começou quando era voto secreto, estão
rasgando a Constituição, mudando a regra no meio do jogo, me considero um bode
expiatório perseguido politicamente”. Perguntado se gostaria de voltar à
política, respondeu: “Sendo liberado, por que não? Fiz meu trabalho com muito
carinho e amor.” O ex-deputado ouviu o restante da defesa de seu advogado na
tribuna e, logo em seguida, saiu pela última vez do plenário da Câmara, sem
esperar o resultado.
“Meu
processo começou quando era voto secreto, estão mudando a regra no meio do
jogo, me considero um bode expiatório”
Natan
Donadon, ex-deputado federal
Nova
chantagem do PMDB
Depois
de abrir mão de indicar nomes aos ministérios em que tem representantes no
comando, a bancada do PMDB na Câmara anunciou ontem que votará contra todas as
propostas consideradas prioritárias pelo governo. Isso inclui cinco projetos
com urgência constitucional, como o Marco Civil da Internet, que trancam a
pauta, e vetos presidenciais. “Não é que sejamos contra os projetos. Queremos
apenas limpar a pauta”, comentou o líder do partido, Eduardo Cunha (RJ). A
legenda é a maior da Casa — com 75 deputados — e vem travando longas batalhas
com o Palácio do Planalto desde que Cunha assumiu a liderança, no início de
2013.
Memória
Autoridade
na cadeia
O
deputado Natan Donadon (sem partido-RO) está preso em ala especial da Papuda
desde junho de 2013. Ele foi o primeiro congressista a cumprir pena de regime
fechado durante o exercício do mandato. Donadon se entregou em 28 de junho, após
ser condenado a 13 anos, 4 meses e 10 dias de prisão por formação de quadrilha
e peculato. Os crimes envolvem o desvio de mais de R$ 8 milhões da Assembleia
Legislativa de Rondônia. Ele nega ter cometido qualquer crime. Depois da
prisão, Donadon foi expulso do PMDB. A Câmara suspendeu o salário do
parlamentar e exonerou os funcionários de seu gabinete.
Fonte: Correio Web.
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