Cunha anunciou a volta do benefício para cônjuges de parlamentares, mas a Mesa precisa autorizar a compra
A Casa diz que não tem nos arquivos a relação de bilhetes aéreos
utilizados entre 2007 e 2008. Investigação está emperrada na Polícia Federal,
no Ministério Público e no Supremo Tribunal Federal.
Investigada pelo Supremo Tribunal Federal (SFT), pela Polícia Federal e
pela Procuradoria-Geral da República (PGR), a relação dos bilhetes aéreos
usados por parlamentares em 2007 e 2008 — no episódio que ficou conhecido como
a farra das passagens — não consta mais nos arquivos da Câmara. Dados
fundamentais para basear as apurações da época em que parentes, amigos de
congressistas e até mesmo artistas viajavam por conta de gastos públicos, as
informações desapareceram.
Em resposta a um pedido de acesso aos documentos pela Lei de Acesso à
Informação (LAI), o Departamento de Finanças, Orçamento e Contabilidade (Defin)
da Câmara informou que, de acordo com o Ato da Mesa Diretora n° 42 de 2000, “a
participação da Casa no processo compreendia a concessão da cota e o posterior
recebimento das faturas das companhias aéreas aqui instaladas para fins de
conferência e pagamento”.
Apesar de a Câmara ter identificado o pagamento de bilhetes aéreos a
terceiros — como a viagem da apresentadora Adriane Galisteu, da mãe dela, Emma
Galisteu, e de um amigo com recursos da cota parlamentar do deputado Fabio
Faria (PSD-RN) —, o Departamento de Finanças da Câmara respondeu, no ofício da
Lei de Acesso à Informação, que a Casa não “possuía ingerência na relação
estabelecida entre os deputados e as companhias aéreas credenciadas, razão pela
qual a Casa não dispõe de registros de emissões de passagens aéreas realizadas
pelos deputados em 2007 e em 2008”...
No documento, a Câmara ainda ressaltou que “o controle das emissões de
bilhetes somente passou a ser exercido pela Casa em 2009”, ano em que instituiu
mudanças na cota parlamentar, pelo Ato da Mesa Diretora nº 43. A assessoria de
imprensa da Casa frisou também que as passagens aéreas são as únicas
informações do chamado “cotão” das quais não há comprovantes guardados nos
períodos anteriores a 2009. “Todos os demais itens — gastos com combustível, locação
de veículos, manutenção de escritório — contam com documentação comprobatória
nesses períodos.”
Contradição
A ausência das informações, porém, contradiz com as investigações da
época, quando a própria Câmara apurou, por meio da Comissão de Sindicância da
Casa, a participação de 45 servidores que seriam os responsáveis pelo
escândalo. Eles estariam ligados aos gabinetes de 39 parlamentares. Naquele
ano, a Câmara abriu processo contra 44 servidores — um deles faleceu e teve o
caso arquivado. Mais da metade dos funcionários foi demitida durante as
investigações.
As passagens da apresentadora Adriane Galisteu, da mãe e do amigo
custaram à Câmara cerca de R$ 11 mil. Faria também deu passagens aos atores
Kayky Brito, Sthefany Brito e Samara Felippo, que participaram do carnaval fora
de época em Natal em dezembro de 2007. Eles foram convidados para o camarote
que o deputado organizou para o evento. Após a reportagem, o parlamentar
ressarciu à Câmara o valor das passagens dos atores.
Apesar de já terem se passado seis anos desde que o escândalo das
passagens de deputados e senadores veio à tona, nenhum político foi punido. Há
pelo menos oito anos, um inquérito criminal se arrasta entre o STF, a Polícia
Federal e a Procuradoria-Geral da República. A apuração corre em segredo de
Justiça e tem 20 investigados. Em consulta ao Supremo, é possível identificar
que o processo foi concluído em 17 de março deste ano, remetido ao relator,
ministro Teori Zavascki, e despachado à PGR.
Colaborou Eduardo Militão
Memória
Mordomia à custa do erário
Em 2009, o país descobriu que senadores e deputados usavam as cotas de
passagens aéreas a fim de viajar para o Brasil e para o exterior a passeio. Em
muitos casos, cediam o benefício para aliados, parentes, amigos e até mesmo
para celebridades, cantores atores a apresentadores. Também foi identificado um
comércio ilegal de crédito de passagens. Mais da metade dos parlamentares da
Câmara usou as cotas para viajar para o exterior em 2007 e em 2008, apenas por
uma companhia aérea.
Identificado o problema, o Congresso mudou as regras, restringindo as
viagens ao exterior, mas perdoou as irregularidades do passado. Nenhum
parlamentar foi punido, apesar de vários terem devolvido o dinheiro gasto em
interesses particulares. Embora uma série de inquéritos civis e criminais
tenham sido abertos, o Ministério Público nunca ofereceu denúncia à
Justiça.
Este ano, após ser eleito presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
anunciou a volta do benefício para cônjuges de parlamentares. No entanto, após
a repercussão negativa, decidiu que a regalia só será concedida após
autorização da Mesa Diretora caso a caso.
(EM)
Fonte: Por Naira
Trindade, Correio Braziliense. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil - 23/03/2015 - -
12:37:33
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