sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Votação secreta será levada ao Supremo


Presidente da Câmara Legislativa diz que vai cumprir decisão de colocar o processo de Raad em análise sigilosa no plenário da Casa, mas irá provocar a discussão no STF. Especialistas criticam a determinação da Justiça do DF.

Um dia depois de o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) estabelecer votação secreta do processo do deputado distrital Raad Massouh (PPL), o presidente da Câmara Legislativa (CLDF), Wasny de Roure (PT), disse que vai seguir a determinação, mas recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar o entendimento dos desembargadores sobre o sigilo. “Queremos ampliar o debate sobre o tema”, disse.

Com a posição dos magistrados do Conselho Especial, Raad Massouh passa a ser o segundo distrital a desviar-se da previsão regimental da Câmara Legislativa, que estabelece votação aberta em casos de cassação. A ex-deputada Eurides Brito também conseguiu esse direito em 2010, mas acabou cassada. Raad é suspeito de desviar parte de uma emenda liberada por ele mesmo, há três anos, para um evento de Sobradinho. ...

A possibilidade de que assembleias legislativas estaduais e a CLDF possam fazer votações abertas sobre casos de cassação parlamentar já foi analisada pelo STF em 2005. Na época, o Partido Social Liberal (PSL) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT) foram ao Supremo (ADI 1461-2) para barrar a previsão da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) de promover análises abertas em suas sessões de cassação parlamentar. Na ocasião, os ministros Marco Aurélio Mello e Celso de Melo se manifestaram favoravelmente à Alerj, mas foram vencidos pela maioria. Os demais integrantes da Corte entenderam que aos deputados estaduais são aplicadas as mesmas regras previstas no Congresso Nacional (confira O que diz a lei).

Segundo o assessor Cível e de Constitucionalidade do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), promotor Antonio Suxberger, é discutível se a previsão de voto secreto na Constituição Federal deve ser reproduzida obrigatoriamente pelo DF e pelos estados. “No âmbito do DF, no entanto, depois da decisão proferida no caso da ex-deputada Eurides Brito, somente uma modificação da Constituição para solucionar a questão”, explica. No caso de Eurides, o MPDFT não chegou a analisar a constitucionalidade do artigo da Lei Orgânica que prevê votação aberta para cassação.

Segundo Wasny de Roure, a discussão será levada ao Colégio de Líderes da Câmara tão logo o TJDFT notifique a Casa, o que não tem data para ocorrer. Para ele, a decisão da Justiça é um retrocesso. “O DF foi pioneiro ao estabelecer a votação aberta, mas seguiremos a decisão. Também iremos ao Supremo politizar o debate como forma de prestar um serviço à população, que anseia por mais transparência dos poderes”, afirma.

O presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Ibaneis Rocha, também defende a transparência. “Em questões corporativas, como é o caso da análise de decoro parlamentar, sou amplamente favorável à abertura das votações”, defende. Para ele, a CLDF deve dar exemplo. “O que está em julgamento é uma instituição legislativa, que deve corresponder aos anseios da sociedade por mais transparência e seriedade.”

Clima favorável


Tão logo soube do resultado favorável na Justiça, Raad passou a postar mensagens de otimismo em uma rede social. Falou em “milagre” e “segunda chance”. A interlocutores, o distrital também garante que contará com o apoio velado de alguns colegas, o que lhe seria suficiente para escapar da cassação (são necessários 13 dos 24 votos para ele perder o mandato). Nos corredores, o parlamentar também é visto com maior frequência, embora tenha adotado postura mais serena em suas palavras e ações, em oposição ao seu estilo de enfrentamento.

Para o presidente da Comissão de Ética da Casa, Dr. Michel (PP), a votação secreta “serve para esconder a cara do deputado perante seu eleitorado”. Ele é a favor da abertura da votação. O corregedor da Câmara, Patrício (PT), defende a transparência, mas, segundo ele, o voto secreto pode garantir o anonimato de parlamentares que queiram desobedecer as orientações de seus grupos partidários. “Aquele voto de rebeldia contra o governo, por exemplo, poderia ser desperdiçado caso a votação fosse pública. O tiro pode sair pela culatra”, aposta.

Mandado

Raad recorreu à Justiça para anular o relatório produzido por Joe Valle (PDT) na Comissão de Ética, que pediu sua cassação, e para ter o mesmo tratamento concedido a Rôney Nemer (PMDB), Benedito Domingos (PP) e Aylton Gomes (PR). O trio teve processos de cassação paralisados até manifestação de segunda instância pela Justiça. Raad pediu, ainda, a garantia da votação secreta, direito concedido pelo TJDFT.

O que diz a lei
O parágrafo 2º do artigo 55 da Constituição Federal prevê que a perda do mandato de deputados federais e senadores será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado por análise secreta e por maioria absoluta de votos. Já o parágrafo 1º do artigo 27 da Carta Magna impõe a deputados estaduais as mesmas regras nas votações de quebra de decoro.

No entanto, segundo Marco Aurélio Mello e Celso de Melo, ministros do Supremo, a vinculação, pelos estados, das regras de âmbito federal serviria apenas para definir em quais casos há previsão da perda de mandato. Nessa perspectiva, o rito formal que cada assembleia legislativa poderia adotar para analisar cassação parlamentar poderia ser definida em lei estadual específica.

Essa previsão encontra ressonância no artigo 1º da Constituição, onde fica claro que o Brasil é formado “pela união indissolúvel dos estados e municípios e do Distrito Federal.” Daí seria assegurada a autonomia normativa entre os entes federados e a possibilidade de cada Poder Legislativo adotar ritos próprios para previsões constitucionais, como a perda de mandato.
Fonte: Arthur Paganini - Correio Braziliense - 24/10/2013

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